Relato do parto da Manu, parto unassisted da Meire

Pra mim a Manuela desde que decidiu que viria ao mundo resolveu fazer do jeito dela. Desde a gravidez inesperada, sete meses depois do nascimento do Teodoro até a forma como foi o parto. Eu tenho a impressão que isso será um traço na personalidade dela: imediatismo. Vamos aguardar.

Bom, tudo começou numa quinta feira depois do carnaval, quando fui levar o Gabriel na casa da minha mãe, pois eu iria a um retiro da igreja e ficariamos até domingo em um hotel. Quando eu voltava de lá dirigindo, tive um clique, não sei, fiquei pensando que dia era, que dia deveria ficar menstruada e me deu um insight: “tô grávida”.

Cheguei em casa, falei isso pro Marcos. Ele me disse que não era não, vamos pro retiro, na semana que vem a gente vê isso. Mas eu tinha certeza que era. Na sexta feira, pedi pra ele ir a uma farmácia perto do hotel e comprar o Clear Blue. Batata: duas listrinhas azuis. Super nítidas. Eu chorei tanto.... Olhava pro Teodoro comigo, lembrava que fazia nem 4 meses que eu tinha voltado da licença, que eu não tinha emagrecido tudo que eu queria e precisava. Liguei pro Dr. Jorge chorando, ele me disse que se as duas linhas estavam bem nítidas ele nem pediria o exame de sangue pra confirmar. Era positivo mesmo! Me deu os parabéns super empolgado. Fiquei lá no retiro, rezei, me acalmei. Já que aconteceu vamos curtir.

A gravidez foi super tranquila. Nem engordei muito. Viajei a trabalho pra França quando estava com 5 meses. Com 6 meses tive diagnóstico de diabetes gestacional. Tudo controlado. Preciso decidir onde ter o bebê.

Eu estava tranquila porque o parto do Teodoro no Einstein tinha sido super bom e por mim iria pra lá de novo. De repente começaram a aparecer casos onde o Einstein não era mais o mesmo. Conversei com os responsáveis lá sobre os meus desejos pro parto e depois de muita argumentação eu ouvi a seguinte frase deles: “ se o Einstein não está de acordo com a sua filosofia de criar filhos, a senhora deve procurar outra instituiçao”. Isso só porque eu queria ficar com meu bebê depois que nascesse, que não pingassem o nitrato de prata, essas coisas. Fiquei tão chateada. Não sabia o que fazer. Não conseguia me definir pelo parto em casa, mas não conseguia decidir por um hospital: nem o Einstein nem o São Luiz. Quer dizer, o Einstein já estava fora de cogitação mesmo. Mas o São Luiz....

Quando eu ia pro escritório da empresa em São Paulo, passava no caminho perto do São Luiz e pensava: preciso visitar o hospital, pelo menos pra ter certeza que não vai nascer lá. Mas nunca dava certo. Enrolei tanto que acabei não visitando o hospital.

O Dr. Jorge e a Ana Cris falavam conosco sobre o parto domiciliar mas eu não conseguia dizer a frase que eu sempre ouvia de mulheres que tiveram parto domiciliar: “eu não penso em ter meu filho em outro lugar senão em casa”.

O Marcos tinha uma preocupação com relação ao parto domiciliar: a logística. Como alimentar a todos, todo o material necessário, e se as crianças começam a surtar no meio do parto, e se os vizinhos reclamarem e tal. Aí o Dr. Jorge enviou pra ele a lista dos materiais pro parto em casa. O Marcos foi à trabalho pra Argentina e chegou em casa com uma touquinha rosa de algodão linda linda. Perguntei algo sobre para que ele tinha comprado a touca se a Manuela ia nascer no verão? Ele disse que a touca estava na lista do Dr. Jorge. E aí eu percebi que pra ele o parto ia ser em casa mesmo. Eu é que tava empatando as coisas. Que medo que dá quando a decisão está na mão da gente...

Continuei enrolando, até que fomos pra Atibaia, no encontro da Materna. A Ana Cris veio conversar comigo sobre minha escolha pro parto. Ela me disse para pensar em ficar em casa. E se eu mudasse de idéia no meio iriamos todos pro hospital, afinal todos os partos que são no hospital começam em casa. E ela me sugeriu separar alguma coisa pro parto domiciliar, como um gesto simbólico de me dispor a ter a bebê em casa.

Gostei da idéia. Separei as toalhas de banho, lençol, e as fraldinhas para enrolar a bebê. Quando eu tava passando as fraldas ficava pensando que ia ser mesmo legal se ela nascesse em casa e poder enrolá-la nesses paninhos.

O Marcos cuidou para que toda a lista de material fosse providenciada. E o cantinho das coisas pro parto domiciliar ficou pronto, dentro do berço da Manuela. Eu olhava praquele monte de coisa todo dia e pensava: que bom, tomara que eu use mesmo. Só faltava o plástico pra forrar a cama.
Dia 21/10 eu tive consulta com o Dr. Jorge, marcamos um retorno pro dia 01/11, quando eu estaria com 39 semanas e meia. Nessa consulta eu pedi pro Dr. Jorge ver minha dilatação, porque eu queria muito saber se dessa vez meu corpo tava fazendo algo diferente do parto do Teo, quando eu cheguei em 42 semanas com quase nada de dilatação. Estava então com 37 semanas e 2,5cm de dilatação. Fiquei tão feliz. Não achei que o parto estivesse próximo, mas o meu corpo começar a dar sinais sozinho que sabia o que fazer me animou.

Minhas Braxton estavam bem fortes e começavam a me irritar. Eu sei que elas preparam o útero, mas se não vai dar em nada, podiam passar despercebidas né? Eu tinha que parar o que estava fazendo quando elas vinham.

Na madrugada do dia 27/10 pro dia 28/10, acordei duas vezes de madrugada sentindo contração. Não dor. Adormeci em seguida xingando: pô só me faltava essa, nem completei 39 semanas e agora acordo até com Braxton???

Mas o fato é que depois que acordei percebi que estava tendo eram contrações mesmo, doloridas, totalmente suportáveis, mas não imperceptíveis. E não me impediam de fazer nada.
Passei um pedaço da manhã assim e resolvi contá-las: irregulares, aproximadamente 7 contrações por hora.

O Marcos teve o famoso nesting, ou instinto pra preparar o ninho. Ele passou a manhã inteira em supermercados. Foi em 4 diferentes. Comprou o sorverte que eu vinha pedindo faz tempo, pra tomar durante o expulsivo. Comprou lustres novos pros quartos (nosso e dos meninos), comprou o plástico que faltava pra forrar a cama. Arrumou os armários da cozinha, enfim, deixou tudo tinindo. E ainda dizia que ia demorar pra bebê nascer, que não ia ser naquele dia não.

Eu nem liguei. Fiquei curtindo estas contrações, mas elas não engatavam.... Minha mãe tinha combinado com o Gabriel para ele ir pra lá nesse sábado e eu o pegaria lá no domingo, pois teria que votar lá perto e ele foi. Ficamos em casa eu, o Marcos e o Teodoro. Almoçamos comida chinesa. Eu comi a caixinha inteira de yakissoba. O Marcos não botou uma fé. Eu ia precisar de energia mesmo.

A tarde continuou tudo igual, por pura falta do que fazer achei melhor avisar a Ana Cris desse quadro. Ela me disse que poderiam ser pródomos e pode ser que até parasse tudo. Mandou continuar de olho e caso o quadro evoluísse para eu avisá-la. Tirei um cochilo à tarde, acordando nas contrações, aproveitei para marcá-las, mas o quadro não mudava, no máximo oito por hora.
Acordei, fui fazer xixi e quem apareceu??? Meu tampão! Caramba, não é que eu acho que aprendi a parir, meu corpo tá funcionando! Liguei de novo pra Ana Cris. Ela disse que isso era um sinal de contrações eficientes mesmo, então provavelmente o TP engataria à noite ou no dia seguinte. Beleza!

À noite tinhamos eucaristia na igreja. Era às 20h. Resolvi que eu ia. Quem sabe não parava tudo? Tava ficando entediada de ficar em casa e não rolar nada... Contei ainda as contrações das 18h até as 19h pra ver se elas não estavam mais perto e eu que não percebia. Mas elas estavam a mesma coisa. Dei janta pro Teo, o Marcos deu banho nele eu o troquei, me arrumei e fomos pra igreja.

Chegando lá, assisti mais de uma hora da celebração. Depois da homilia do padre, comecei a achar que as contrações estavam mais fortes. Falei pro Marcos e ele ainda disse: “Meire, eu não vou pra casa, vamos chegar lá e vai parar tudo! Espera mais um pouco”. O fato é que a gente com a experiência do parto do Teo tava escolado e achava que ia ter um parto demorado de novo. Fiquei andando atrás do Teo na igreja e o negócio começou a pegar mesmo. Fui no banheiro e começou a sair sangue. Falei pro Marcos e aí ele achou também que era melhor ir pra casa. Até aí tava tudo bem, conseguia sorrir pras pessoas, e tal. Quando eu pus o pé fora da igreja, eu tive uma contração animal. Minha perna esquerda teve uma tremedeira horrível e eu achei que não ia sair dali. Aliás, até hoje não sei como atravessei a rua pra entrar no carro. Nesse tempo o Marcos já tinha ligado pra Ana Cris pra pedir pra ela vir. Depois a Ana me contou que quando o Marcos ligou pra ela nessa hora ela percebeu que ia ser rápido.

Eu fui ajoelhada no banco de trás do carro, segurando no encosto. Enquanto o Marcos acomodava o Teo e dava a partida tive uma contração e PLOC!
- MARCOS, MINHA BOLSA ESTOUROU!!!!
- Fica tranquila Meire, deve ser xixi!
- FOI A BOLSA, EU OUVI O BARULHO!

Barulho não, eu senti aquele ploczinho dentro da gente.

O Marcos ligou de novo pra Ana, que já estava a caminho e mandou que ele me colocasse no chuveiro quente até que ela chegasse. O Dr. Jorge também já estava vindo. A igreja fica a quatro quadras da minha casa, chegamos em 5 minutos. Paramos o carro no S2, entrei no elevador e agarrei o pescoço do Marcos que estava comigo pendurada no pescoço, o Teodoro no colo, as bolsas... Coitado! Pois bem, não bastasse essa cena o elevador parou no S1. Entraram cinco pessoas. Quando o Marcos viu que o elevador ia parar ele me pediu pra dar um passo mais pra frente pras pessoas entrarem, eu estava muito na porta. Fingi que não ouvi, não conseguia me mexer! O Marcos explicou por cima o que tava acontecendo e eu não via a cara de ninguém. Descemos no meu apartamento, todos desejando boa sorte (e acho que no fundo achando a gente biruta) e eu nem aí pra ninguém. Já tinha acontecido, eu tinha perdido o controle, não conseguia pensar em nada. Apenas que se aquilo era o começo do TP eu não ia agüentar até o final, a dor estava muito forte. Eu achei uma pena não estar preparada para um unassisted, porque se eu estivesse, colocaria minha cabeça no lugar e ia perceber que já era a transição.

Bom, chegando em casa fui voando pro chuveiro, arranquei a roupa não sei como. O Marcos me perguntou se eu queria uma cadeira e eu disse que sim. E também me perguntou se deveria pedir para alguém pegar o Teodoro. Eu disse que sim. A idéia inicial era ele ficar, mas na hora falei pra irem lá buscá-lo, tava muito punk. O Marcos ligou pra minha cunhada, que é enfermeira obstétrica e mora aqui pertinho pra vir buscar o Teo, mas ela disse que estava sem carro. O Marcos disse que ligaria pro meu outro cunhado que mora aqui perto também e desligou. Não falou que já estava em TP. Ele me trouxe a cadeira, mas nessa hora eu senti vontade de fazer força.

- MARCOS, AVISA A ANA CRIS QUE EU TÔ COM VONTADE DE FAZER COCÔ!!!
- Meire, ela já vai chegar!
- LIGA PRA ELA!

Ele ligou e ela disse pra ele me colocar na cama de lado e se eu quisesse fazer força ou qualquer outra coisa, fazer lá. Dispensei a cadeira e enquanto deitava na cama pensei: “se isso continuar assim, quando o Dr. Jorge chegar eu vou pedir uma cesárea”. Pô, lógico que eu tava na transição, pensar um treco desses.... hahahaha

Deitei na cama e tive uma contração muito forte. O Teo queria subir na cama e o Marcos não deixava e eu falei: “põe ele na cama”. O Marcos entendeu que era pra levar pro berço no outro quarto e eu gritei:
- PÕE ELE AQUI DO MEU LADO! E FAZ QUALQUER COISA, MAS NÃO ME DEIXA SOZINHA!!!!

Pois bem, o Teo ficou quieto do meu lado e o Marcos começou a ligar pro meu cunhado vir buscá-lo. Tive outra contração forte e senti a neném lá embaixo. Caramba!!!!!
- MARCOS, ELA TÁ AÍ EMBAIXO.

Eu não abri a perna, o Marcos levantou minha perna e nessa hora tive outra contração. Ele tava falando com o meu cunhado, simplesmente jogou o celular ainda ligado: nessa contração a Manuela saiu. Inteirinha. Senti o círculo de fogo. Não senti dor... Tudo durou como vocês podem perceber, no máximo, 15 minutos desde que chegamos ao apartamento.

O tempo parou. O Marcos falou calmamente: “respira filha, respira”. Ela chorou enquanto vinha pro meu colo. Meu cunhado ouviu tudo pelo celular, veio pra casa que nem louco. Ele minha cunhada e meus três sobrinhos.

Ela tava roxinha, mas chorou. Pedi pro Marcos ir buscar as fraldinhas pra gente tentar aquecê-la. E agora? O pessoal ainda vai chegar. Só lembrei de fazer massagem nas costas dela, e aquecê-la. Não sabia o que mais era pra fazer. Ah, e ver se ela queria mamar, mas ela não quis.

Ligamos de novo pra minha cunhada enfermeira obstétrica e dessa vez contamos o que aconteceu: a Manuela já tinha nascido. Ela veio voando. Foi a primeira que chegou, a Ana Cris chegou logo depois dela. Elas ficaram fazendo uma massagem na minha barriga pra fazer o parto da placenta. Demorou bem pouquinho e a placenta saiu. Sem problemas nenhum. Deixamos ela lá do meu lado, o cordão ainda ligado na Manuela, algo quase tribal – hehehe.

Aí o Dr. Jorge chegou. Coitado, já falei pra ele, mas a impressão que eu tive é que apesar de estar sorrindo, enquanto ele não teve certeza que eu estava bem (física e psicologicamente) ele não respirou aliviado. Me examinou, zero de laceração, nada nada. Eu tava inteira, mesmo com um parto rápido assim e a neném saindo de uma vez só. E ele fez a pergunta fatídica: “alguém lembrou de marcar a hora do nascimento?”. Todo mundo se olhou e deu risada. Pegamos no celular pelo horário da ligação do Marcos pro meu cunhado e fechamos em 21h51min.

A Ana Cris também perguntou se tinha mecônio no líquido. Caramba Ana, não sei não. Ela foi recolhendo as evidências e concluiu que sim, tinha mecônio. Demoramos mais de uma hora pra cortar o cordão.

Ah sim, o pediatra. A Ana Paula vinha me acompanhar, mas tinha me avisado que nesta semana ela estaria viajando. Neste caso, combinamos que o Cacá viria, mas eu nem falei com ele porque tinha certeza que daria tempo da Ana Paula voltar. Mas aí a Ana Cris ligou pra ele e ele veio pra cá. Um amor de pessoa, adorei. Achei que ele ia chegar esbaforido por causa do jeito que foi o parto, por causa do mecônio, mas não, ele chegou super calmo, recebendo a Manuela tão tranqüilo, foi muito bom.

Eu fiquei lá no quarto, deitada, descansando. Perdi muito sangue por causa do parto rápido, e todos acharam melhor que eu só me levantasse no dia seguinte. Mas foi bom, porque tive privacidade. Todos ficaram na sala, lanchando e eu fiquei lá no quarto. Levaram lanche pra mim, suco, água e, claro, o sorvete do expulsivo, que virou simplesmente minha sobremesa.

Tive uma queda de pressão, me senti meio mal. Uma coisa leve. O Cacá fez do-in na minha perna, tomei bastante água e me recuperei. Imagina se estivesse no hospital.

Eu adorei parir em casa: a Manuela ficou a noite inteira do meu lado, enrolada nas minhas cobertas, para eu aquecê-la. Nada de pedir permissão pra ninguém pra ficar com seu filho. Quando eu entrei na lista, achava que isso soava prepotente mas não é. Sem necessidade, pra que te separar do teu filho? A Manuela não saiu do meu lado nem um minuto.

Como eu disse, só me ressinto de não estar preparada para um unassisted para poder manter a calma. Foi muito punk na hora e rápido. A gente tava achando que ainda era o início do TP. Por isso ficou agitado. Talvez ficasse mais calmo se a gente soubesse que ia nascer de qualquer jeito ou talvez eu me acovardasse se pensasse isso. Sei lá, eu penso que todos os partos têm um “what if”, que é aquela questão de “e se eu tivesse feito....”

Mas, eu acho que o parto foi como tinha de ser. Uma coisa que eu sempre busquei com os partos foi dar dignidade pro nascimento dos meus filhos, sem colocar ninguém em risco nem buscar alimentar tão somente o meu ego. E tenho encontrado isso a cada parto.

Aqui eu quero agradecer à essa equipe tão especial que nos acompanha. Tão competentes e tão doces e tão humanos, que me respeitam, respeitam as minhas escolhas, colocam-se a nosso favor sempre e nos ensinam sempre também. Obrigada Ana Cris, Dr. Jorge e Mema, que não fez nem um colarzinho durante o meu parto (hihihi) e Cacá. Vocês têm ajudado a deixar o mundo melhor.
E ao Marcos meu marido, que antes não abria mão de cesárea e virou até parteiro, que soube manter a calma no meio do stress e conduzir tudo da melhor maneira possível.

Meire – evoluindo a cada parto!

2 comentários:

  1. Lindo Parto! Dá vontade de rir quando ela "fala da cesariana na cama do quarto dela"... E dá vontade de chorar quando ela fala "para que separar o filho da gente"...
    Parabéns pela superação.

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  2. Fiquei encantada com sua história de amor e superação. Parabenizo o seu marido e seu filho por ser tão corajoso, e lhe dar o que você mas precisava naquela hora. AMOR... Felicidade a você e sua Família

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